Taça cónica em grés revestida a vidrado céladon. O exterior (tardoz) é liso sendo que o interior tem decoração incisa representando uma fénix no fundo e desenhos florais na parede interna que está dividida em seis painéis rematados no topo superior por um friso de gregas. O bordo seria coberto por um aro metálico que se perdeu, sendo visível a seção não vidrada.
A cerâmica monocroma:
Monocromo – do grego monokromos, de uma cor – quando aplicado, como neste caso, à cerâmica chinesa, faz referência às peças decoradas com uma única cor. Porém, o termo pode aludir a dois tipos de objetos:
Vidrados monocromos, ou seja, cerâmica com um vidrado colorido cozido a altas temperaturas junto com o corpo da peça (como é o caso que nos ocupa).
Esmaltes monocromos, peças que usam um esmalte colorido sobre o vidrado e recebem uma segunda cozedura a baixa temperatura.
Embora a cerâmica seja uma das formas mais destacadas da arte chinesa, existem poucos dados sobre a sua origem, assim como sobre a introdução do vidrado, sabendo-se que existem cerâmicas vidradas já desde época Shang (séc. XVI-séc. XI a.C.). Provavelmente os primeiros vidrados foram produzidos de forma acidental ao caírem cinzas da madeira (usada para alimentar os fornos) sobre cerâmica aquecida. Existem numerosos exemplos de cerâmica antiga, nomeadamente chinesa e coreana, que apresentam efeitos de vidrado nas partes mais expostas.
O vidrado é, de forma geral, um revestimento que, ao aquecer, se funde com o objeto cerâmico, podendo ter o intuito de melhorar as propriedades mecânicas ou de impermeabilização das peças ou ter uma finalidade decorativa. Os vidrados cerâmicos são normalmente compostos por sílica, uma mistura de outros materiais que se utiliza para baixar o ponto de fusão e corantes, como o óxido de ferro, o carbonato de cobre ou o óxido de estanho.
Embora, como já foi dito, existam cerâmicas vidradas desde épocas muito anteriores, o grande desenvolvimento dos vidrados coloridos terá começado na dinastia Tang (618-907), quando os oleiros começam a diversificar as cores do vidrado, mas será durante a dinastia Song (907-1279) – momento no qual foi fabricada a taça em análise – que se alcança a época dourada dos monocromos, com peças de formas muito depuradas e grande simplicidade bem ao gosto tradicional chinês.
Posteriormente, durante as dinastias Ming e Qing, o vidrado foi realizado usando tanto altas como baixas temperaturas, sendo as cores produzidas usando ferro, cobre, cobalto ou inclusive ouro, conseguindo reproduzir quase todas as cores de épocas anteriores e muitas novas cores. Estes oleiros eram grandes admiradores dos monocromos de época Song, que muito imitaram.
A cerâmica celadon (“ch’ing tz’u” ou “Qing Ci”):
“Os celadons são os mais importantes de entre as primitivas cerâmicas chinesas, e o seu estudo é a base fundamental para a investigação de toda a cerâmica Chinesa.” Baron Ozaki
O vidrado conhecido como ‘celadon’ é, provavelmente, um dos que teve maior popularidade e longevidade ao longo da história da cerâmica chinesa. Quando falamos em celadons estamos a fazer referência a objetos cerâmicos com um vidrado feldespático cuja cor se deve à presença de ferro, sendo que o tom – que pode variar desde o acinzentado ao verde-oliva ou ao azul-esverdeado – depende, não só da quantidade deste, como também das condições da cozedura (tempo, temperatura e tipo de atmosfera).
A palavra celadon é uma palavra francesa que deriva do nome de um dos protagonistas da peça L’ Astrée; o pastor Céladon – do escritor francês Honoré d’Urfé publicada em 1610 – que trajava uma capa com fitas verdes durante a representação. Nessa época o fluxo de peças da China a chegar a França já era considerável e, sendo França o modelo para o resto da Europa no que respeita à catalogação de peças de porcelana da China, o nome vingou.
Porém, muito antes dos celadons serem conhecidos em Europa, já eram muito apreciados no Oriente, sendo que durante as dinastias Song e Ming as exportações a lugares como a Índia alcançaram enormes proporções.
A grande beleza do vidrado celadon deu lugar a várias lendas, associando a estas peças diversas propriedades como por exemplo, no Oriente próximo e Europa, era acreditado que os pratos celadons tinham a capacidade de revelar a presença de venenos na comida servida neles. Outro caso no que podemos observar a importância dada às peças celadon é o das taças de chá, que eram preferidas já que este vidrado realçava a cor esverdeada da bebida, e por isso eram consideradas de uma qualidade superior. Uma das características mais apreciadas nos celadons, era a aparência do muito apreciado jade, sendo que muitas vezes este seria o objetivo principal procurado pelos chineses nos vidrados celadons, dado o jade ser o material mais valorado.
A história dos celadons remonta ao século III a.C., mas será durante a dinastia Song que estes alcançam o maior grau de perfeição.
A cerâmica “Ting” ou “Ding”: o exemplar da Casa-Museu
A cerâmica “Ting”, ou “Ding”, é um tipo de cerâmica produzida nos fornos de Ding Xian, actual Chu-yang, na província de Hebei, desde o século VIII. Embora habitualmente esta cerâmica seja de cor branca, existem também peças com outro tipo de vidrados, como o exemplar celadon da Casa-Museu. De formas simples e elegantes, os pratos, tigelas e taças Ting – tipologias mais características – podem ser lisos ou ter decorações incisas ou impressas sob o vidrado, entre as quais as mais populares são os desenhos de fénix e os desenhos florais (lírios, peónias e lótus), tal e como no caso em estudo, em que o exterior é liso e no interior desenhos florais decoram a parede interna enquanto no circulo da base aparece uma fénix (recorde-se que a fénix, ou feng huang, era na China um pássaro sagrado, símbolo da fortuna, da fertilidade, da abundância, da sorte e da longevidade).
A disposição das peças no forno durante a cozedura, empilhadas de cabeça para baixo para evitar deformações e potenciar um maior número de exemplares em cada fornada, resultava que o bordo destas ficasse sem vidrado, pelo que era posteriormente aplicado um aro metálico que, no caso da taça da Casa-Museu, se perdeu.
A cerâmica Ting é considerada uma de entre os cinco tipos de cerâmicas principais durante a dinastia Song, juntamente com a Jun, Guan, Ge e Ru, a última das quais viria substituir a cerâmica Ting na corte, já que as peças eram completamente vidradas.
Proveniência:
Adquirido num leilão da Soares e Mendonça, no Antigo Palácio da rua Luz Soriano, em Lisboa, no dia 24 de março de 1956, lote 229.
Samantha Coleman-Aller
Casa-Museu Medeiros e Almeida
China, Dinastia Song (960-1279)
Goa, Índia
Grés vidrado
Altura: 5,8 cm, diâmetro (menor): 6,3 cm