Par de candelabros em bronze sobre colunas de fluorite
França (?) / Inglaterra (?)
Final séc. XVIII, início séc. XIX (?)
Bronze dourado e patinado e fluorite
Alt: 215cm / Alt. colunas: 133,5cm – Perímetro: 64cm
Na sala dos relógios destaca-se um par de luminárias compostas por candelabros de três braços em bronze dourado, apoiados em figura humana representando Hércules. Estes assentam sobre coluna cilíndrica, em fluorite de diversas tonalidades rosa e violeta, assente sobre base quadrada do mesmo material.
Fluorite e bronze
A fluorite é uma pedra semipreciosa, que dadas as suas características de reflexão da luz e pelo baixo grau de dureza na escala de Mohs (4), é muito procurada para objectos decorativos e de adorno. No entanto, a sua capacidade de fusão tornaram-na na actualidade muito apetecível também para a indústria (óptica, vidro, esmalte, química).
Explorada em diferentes zonas do globo como Canadá, Estados Unidos, África do Sul, Inglaterra, Alemanha, França, a fluorite, um mineral cristalizado pode ter diferentes cores como o amarelo, o vermelho, o laranja, o verde, incolor, sendo o violeta o mais comum. Em Inglaterra extraída (uma variedade especifica de tonalidade violeta) desde cerca de 1770, na região do Derbyshire, foi designada por Blue-John (derivação do francês bleu – jaune).
Muito procurada para a execução de objectos decorativos no século XVIII, como perfumadores, urnas, taças, luminárias de mesa, integra o grupo de materiaiss de luxo como porcelana, esmaltes, outras variedades de pedras ou vidro, transformadas para criarem peças raras ao gosto das elites da época. As peças podiam ser apenas num material ou associar outros, igualmente ricos, com encastoamentos em prata ou mais comummente em bronze dourado.
Raro é, no entanto, o uso da fluorite para a execução de colunas com esta dimensão, sendo mais comum encontrar objectos de tamanho muito mais reduzido neste material, tornando estas peças excepcionais. (Exemplos: https://www.pinterest.pt/markceal/blue-john-stone-decorative-objects/)
A associação ao bronze de matérias-primas raras, difunde-se em França ao longo de todo o século XVIII, em particular a partir de meados do século, por acção dos chamados marchands-merciers, influenciadores do gosto, comerciantes de peças de luxo que muitas vezes as idealizavam, mas não criavam ou executavam. A sua concretização ficava a cargo de desenhadores, escultores, bronzistas, marceneiros…
Na Europa, a exploração da fluorite surge em Inglaterra (Derbyshire) em meados do século XVIII, o que levou à produção de objectos ornamentais neste material, tanto neste país como em França, que a terá começado a importar já aparelhada, sendo depois as peças adornadas com bronze. Em Inglaterra, este tipo de objecto parece ter-se popularizado um pouco mais tarde, no último terço do século XVIII, sob a influência de Matthew Boulton (1728-1809) refinado desenhador / bronzista, natural de Birminghan.
No entanto, o gosto por este tipo de peças, surgiu primeiro em França. Iniciámos o estudo desta peça no pressuposto da sua origem inglesa, eventualmente atribuível a este desenhador inglês, no entanto, aquando da desmontagem dos candelabros, verificamos, para além do seu cariz essencialmente francês, a existência de marcas imputáveis a bronzistas franceses. Em França à época, nomes como o de Pierre Gouthière (1732-1813), Jean-Claude-Thomas Duplessis (1730-1783), Pierre-Philippe Thomire (1751-1843), etc. faziam sucesso na execução de trabalhos em bronze, quer fossem associados ou não a outros materiais, tendo todos produzido peças requintadas de materiais raros decorados por bronze.
Como era comum, as peças eram realizadas aos pares ou conjuntos, como parece ter sido o caso aqui, dadas algumas marcas que o bronze exibe. De facto, a desmontagem dos candelabros revelou pequenos pontos (usados como marcas pelos bronzistas) destinados à sua montagem. Estas marcas indicam o número 3 e 4 o que nos faz crer a eventual existência de outras peças do mesmo conjunto. Por sua vez, um dos espigões centrais está marcado com o número “I”. Até ao momento foi impossível identificar o seu autor, dado as peças não estarem assinadas.
As colunas
O par de colunas cilíndicas ergue-se de uma base quadrada sendo a união rematada em baixo por grosso anel de bronze cinzelado com entrelaçado de folhas de louro. A escala da peça permite que a pedra preciosa se revele em todas as suas possibilidades, apresentando uma grande diversidade de cores do caraterístico violeta aos amarelos e castanhos.
Os candelabros
Também conhecidos como girândolas, estas duas peças terão existido enquanto parte de um conjunto de luminária, típico da época do Diretório (1795-1799) francês, que eram utilizadas para pousar sobre chaminés ou cómodas. O contraste entre o bronze dourado e o bronze patinado é também caraterístico do estilo diretório.
Constituídos por três braços de luz, os candelabros apresentam marcas indicadoras da existência de um possível quarto braço (mais alto), que se situaria ao centro, presentemente rematado por um espigão de enroscar, decorado com folhagem.
O conjunto é formado por uma base em bronze dourado decorada por parras e uvas, sobre a qual se ergue a figura de Hércules, em bronze patinado, que, com os braços levantados segura duas serpentes, por sua vez enroladas numa urna que o herói suporta sobre ombros. As urnas, de bases gomadas, da qual se erquem os braços de luz em bronze dourado são decoradas por folhagem de acanto na base e nos bobeches.
A base, forrada com papel carmim, sugere igualmente que estas se tratavam de peças que funcionavam independentemente.
O facto de os candelabros assentarem diretamente sobre as colunas, não havendo qualquer tipo de rebordo de segurança que os fixe, tal como seria expectável em peças destas dimensões, bem como, sabermos que os dois candelabros pertenciam a um conjunto maior (pelo menos de quatro), e verificarmos que a sua decoração da base não se articula em termos estilísticos com a do anel da base da coluna, sugere que este par de colunas tenha sido o resultado da montagem de peças separadas realizada em data desconhecida. Acresce ainda o facto de o bordo superior de ambas as colunas se encontrar deteriorado (algo que não pode ter sido provocado pelos candelabros de Hércules), indicando a possibilidade de estas terem tido outra peça no seu topo, esta com rebordo que teria “magoado” a pedra.
Hércules / Heracles
A figura que sustenta os candelabros, representa Hércules, segurando duas serpentes e vestindo uma pele de leão.
Filho de Zeus e de Alcmene, Heracles tinha sido destinado a ser rei da Grécia por seu pai. No entanto, Hera mulher de Zeus impediu-o, fazendo nascer primeiro Eurystheus e colocando serpentes no berço de Heracles para o matar. Este teve ao longo da sua vida que servir Eurystheus, que lhe deu doze trabalhos para executar os quais superou ficando a sua figura para sempre associada à bravura e força física.
O primeiro trabalho foi o assassinato do leão de Nemeia e cuja pele passou a vestir. Seguiu-se o assassinato da Hydra de Lerna com nove cabeças e a captura do veado de Arcádia. Depois, a captura do javali do Monte Erymanthu e a limpeza num só dia, dos estábulos do rei Augeas de Elis, seguido pela morte das monstruosas aves comedoras de homens nos pântanos Stymphalian e a captura do touro louco que aterrorizou a ilha de Creta; após o que, veio a captura das éguas comedoras de homens do Rei Diomedes dos Bistones; a tomada do cinto de Hipólito, rainha das Amazonas; a apreensão do gado do gigante de três corpos Geryon, que governava a ilha da Eriteia no extremo oeste; trazer de volta as maçãs de ouro mantidas no fim do mundo pelas Hespérides e a busca do cão de três cabeças Cerberus, guardião de seus portões.
Proveniência
O par de luminárias foi adquirido por Medeiros e Almeida em Londres, ao antiquário Mallet & Son, Antique Dealers Ltd. (40, New Bond Street, Londres), a 31 de Outubro de 1960, por £ 3.000 (o par). O antiquário tinha o par identificado como da autoria de Mathew Boulton, certamente devido ao paralelismo com o tipo de trabalho deste afamado autor.
Cristina Carvalho
Casa-Museu Medeiros e Almeida
Bibliografia / Webgrafia
KISLUK-GROSHEIDE, Daniëlle O.; The Art, Form, and Function of Gilt Bronze in the French Interior, In Heilbrunn Timeline of Art History. New York: The Metropolitan Museum of Art, 2000, http://www.metmuseum.org/toah/hd/gilt/hd_gilt.htm (April 2008)
VOISIN, L. – La Fluorine dans les Ardennes. In Bulletin de la société d’histoire naturelle des Ardennes, 69, 1989. Pp. 27 – 33
Heracles classical mythology (Britannica) – https://www.britannica.com/topic/Heracles
Les bronzes dorés au XVIII ème et XIX ème siècle : Histoire, technique, principaux bronziers (Galerie Napoléon 3)- http://lagalerienapoleon3.com/bronzes-dores/
Vase (Wallace Collection) – https://wallacelive.wallacecollection.org/eMP/eMuseumPlus?service=ExternalInterface&module=collection&objectId=63956&viewType=detailView
Desconhecido
Final do século XVIII, início Séc. XIX
França (?) / Inglaterra (?)
Fluorite e bronze
Alt: 215cm / Alt. colunas: 133,5cm - Perímetro: 64cm