Sir Horace Walpole
Existe na coleção de pintura do Museu, um retrato de grandes dimensões, cuja polémica proveniência e atribuição levou a que fosse retirado para as reservas.
Durante 50 anos esteve exposto na Galeria de Baixo como uma obra de Jonathan Richardson, o Velho, de cerca 1734.
O retrato de grandes dimensões representa Horace Walpole, ainda jovem, de pé, a três quartos com porte muito elegante. O jovem traja uma sobrecasaca de veludo azul petróleo, um colete comprido rosado, ricamente bordado com aplicações a dourado e uma camisa branca com as mangas tufadas nos punhos e gola drapeada. A mão esquerda esconde-se parcialmente na carcela da camisa e a direita, estendida para baixo, segura um panejamento escuro.
Para além de usar peruca curta, de caracóis, à moda da época, o retratado traz à cinta, do lado esquerdo uma espada, símbolo de nobreza. O fundo escuro realça a figura.
A moldura em talha dourada, do século XVIII, foi adquirida pelo colecionador, aquando da compra da pintura.
Sir Horace Walpole (1717-1797), 4º Conde de Orford, foi um historiador de arte, escritor e colecionador. É considerado o pai do romance “gótico” com a obra “O Castelo de Otranto” (1765). A sua mansão de Strawberry Hill (Twickenham, Londres), construída em 1749, introduziu o neogótico na arquitetura inglesa.
Proveniência:
A pintura pertenceu à coleção de John Coubrough (Blanefield House, Stirlingshire) Escócia, tendo sido nesta época emprestada para ser exposta na “International Art Exhibition” (cat. no. 638), que decorreu em Kelvingrove Park, Glasgow, Escócia, entre 2 Maio e 4 Novembro de 1901, sendo erradamente apresentada como “Prince Charles Edward Stuart”, da autoria do pintor inglês Godfrey Kneller (1646-1723);
Pertenceu ainda à coleção do sogro do Lieut-Colonel William Forbes, D.S.O. que, por sua vez, a comprou a um negociante de Glasgow em 1957;
Em altura desconhecida a obra foi reatribuída ao pintor inglês Jonathan Richardson o Velho (1667-1745), sendo o figurado acertadamente identificado como o escritor e historiador Horace Walpole;
Ainda de acordo com a documentação, pertenceu de seguida à coleção do antiquário e colecionador Bryan Hall, de Banningham, Norfolk, Inglaterra, cerca de 1964;
Nesse ano, Adams Kingsley, conservador na National Portrait Gallery de Londres, terá observado que a pintura seria uma cópia da 2ª metade do século XIX porém tal facto não terá chegado ao conhecimento de L.G.G. Ramsey Esq. (1913-1990), editor da revista “The Connoisseur” e membro da Walpole Society, que a adquiriu por esta altura para a sua coleção, como sendo uma das duas versões da mão do conhecido pintor Jonathan Richardson, o Velho;
Pertenceu à coleção de Leonard Gerald Gwynne Ramsey (1913-1990), antiquário, autor, enciclopedista e editor britânico (nomeadamente da conhecida revista “The Connoisseur” desde 1951). Na altura da compra, Ramsey mandou limpar a pintura a William Drown, de Londres, tendo optado, de acordo com as suas palavras, por não fazer uma intervenção mais aprofundada por falta de meios, ficando por explorar uma possível inscrição no canto superior direito da pintura.
A pintura foi adquirida por Medeiros e Almeida a L.G.G.Ramsey (10 Acacia Place, St. John’s Wood), Londres, em 31 de Junho de 1965, pela quantia considerável de £2.500. O conhecimento terá surgido através de Dorothy Hart, a viúva de um conhecido colecionador inglês, Geoffrey Hart (Which Cross Place, Sussesx, Inglaterra), a quem o colecionador comprou muitas obras de arte e de quem o casal Medeiros e Almeida se tornou amigo.
De acordo com a correspondência coeva, Ramsey vendeu a pintura pois desejava adquirir uma casa junto ao mar, devido a doença de um filho. A 12 de Junho, após concordância por parte do colecionador, Ramsey envia uma transparência da pintura, bem como uma publicação que refere a pintura de J. Richardson, referindo que se trata de uma outra versão: “…the only other known example, of the period, of Walpole, by Richardson…” e afirmando que se desconhece a razão pela qual o pintor teria feito duas versões: “…Why Richardson painted another version nobody has ever been able to say…”
De modo a reforçar o seu valor, Ramsey junta ao processo uma avaliação de seguro datada de 26 de Março de 1965, pela firma de restauro William Drown” (110, New Bond Street), Londres, no valor de £2,000, que considera o quadro de “excepcional interesse”: “The above portrait is of such exceptional interest that we value it for insurance at £2.000”.
Na sequência de uma referência no Boletim da Walpole Society de 1968-1970, em que a pintura pertencente a Medeiros e Almeida é referida como sendo uma cópia posterior da obra de 1734, de Jonathan Richardson o Velho: “Copy of uncertain date after Jonathan Richardson”, o Museu, após estudo da obra, pesquisa da sua proveniência e contacto com a Lewis Walpole Library, instituição dedicada ao estudo do legado de Sir Horace Walpole e de Strawberry Hill, apurou que a pintura será uma cópia provavelmente da 2ª metade do séc. XIX, atribuída a um seguidor de J. Richardson.
De acordo com Cynthia Roman, conservadora de estampas, desenho e pintura da biblioteca Lewis Walpole da Universidade de Yale (The Lewis Walpole Library), o retrato que lhe demos a conhecer através de imagem e respetiva documentação, está registdo como uma cópia: “The portrait in your collection is one recorded as a copy”. De facto, o referido boletim da Walpole Society, datado de 1970, da autoria do curador da National Portrait Gallery de Londres, Kingsley Adams, elenca os retratos do autor, surgindo nas páginas 7-9 referência à obra como cópia.
“The Jonathan Richardson portrait of Horace Walpole seems to be a copy of the portrait reproduced as belonging to Lord Waldegrave” – Alex Kidston, Romney Society.
O retrato original de Sir Horace Walpole, datado de 1734-1735, do pintor inglês Jonathan Richardson, o Velho (1665-1745) pertence à família dos Barões de Waldegrave de Chewton House, Chewton Mendip, Bath, Inglaterra. A pintura segue o original excepto na presença do brasão de família que surge no canto inferior direito.
https://libsvcs-1.its.yale.edu/walpoleimages/hwcorrespondence/13/271.pdf
William Arthur Waldegrave (1946-), atual Barão Waldegrave de North Hill, PC emprestou o retrato para uma exposição temporária no Museu Victoria & Albert de Londres, que decorreu entre 6 Março e 4 Julho de 2010: Horace Walpole & Strawberry Hill.
Se bem que, de acordo com o apurado, nos anos 60 já existia a referência a esta obra como tratando-se de uma cópia da segunda metade do século XIX, queremos acreditar que um respeitável autor como Leonard G.G. Ramsey, e membro da Walpole Society, estivesse também ele equivocado quanto à autoria da sua pintura. Medeiros e Almeida, certamente devido à respeitável proveniência, não hesitou em adquirir a obra.
Maria de Lima Mayer
Casa-Museu Medeiros e Almeida
Nota: O Museu agradece a pronta colaboração de Cynthia Roman, conservadora da Lewis Walpole Library da Universidade de Yale (Connecticut, EUA), e de Alex Kidston, da Romney Society (Londres), pelo seu contributo para o esclarecimento desta questão.
NOTA: OBJETO EM RESERVAS
Bibliografia:
ADAMS, Kingsley; LEWIS, W.S.; “The Portraits of Horace Walpole” in: The Forty-second Volume of the Walpole Society 1968-1970, Londres: The Walpole Society, 1970
KETTON-CREMER, R.W.; Horace Walpole, Londres: University Paperbacks Methuen & Co. Ltd, 1964 (1ª edição 1940) (p.49)
BROWNELL, Morris; The Prime Minister of Taste: A Portrait of Horace Walpole, Londres: Yale, 2001
Webgrafia:
The Lewis Walpole Library – https://walpole.library.yale.edu/– http://images.library.yale.edu/strawberryhill/
Walpole Society – https://www.walpolesociety.org.uk/
Museu Victoria & Albert – http://www.vam.ac.uk/content/articles/h/horace_walpole_exhibition/
Stawberry Hill – http://www.strawberryhillhouse.org.uk/history.php